Excelências, Data Vênia
Escrevo-lhes na condição de um leigo na Ciência do Direito, mas um cidadão com ficha criminal limpa, residindo em local sabido, aposentado, depois de passar quase quarenta e dois anos em salas de aula, contribuindo, com a minha força de trabalho e os pagamentos de tributos, para o desenvolvimento desse país.
Assim, a priori desculpo-me por ferir as leis desse país, se isto vier a acontecer, neste texto.
Mesmo nos mais cruéis e duros momentos da Ditadura Militar esperei pelo STF, confiando que aí estava a única força capaz de, pacificamente, à sombra da lei, neutralizar o arbítrio.
O tempo passou, conquistamos melhores dias, com liberdade de pensamento, opinião e manifestação, o que me encorajou a escrever-lhes.
Se no passado a desonestidade se manifestava nas pontas das baionetas e residia em quartéis, hoje se manifesta nas pontas das canetas e reside nos palácios, nas mansões, nas estatais, no poder público e privado, a ele ligado.
Dentro da mesma expectativa do passado, de ver no STF a última cidadela da justiça, após o que só resta a justiça com as próprias mãos, mãe da criminalidade e das revoluções, confesso-me temeroso e decepcionado.
Não me aterei a detalhes, até por uma questão de espaço, enumerando a série imensa de escândalos transformados em processos, que dormem nas gavetas, escaninhos e corredores do STF, aguardando decurso de prazo como artimanha para o exercício da impunidade.
Assim é com o chamado Mensalão Mineiro ou Mensalão Tucano, com o flagrante de um helicóptero com meia tonelada de pasta de cocaína, com o chamado Listão de Furnas, e dezenas, senão centenas de outros mais.
Examinando-se os nomes ligados as esses processos, parados, adormecidos, aguardando o esquecimento, não podemos afastar de pronto a tendenciosidade de pelo menos parte desta corte, uma vez que em ocasiões semelhantes, por delitos iguais, semelhantes ou assemelhados, urgiram os trâmites dos processos, com duras sentenças finais.
Se tudo isto vem me decepcionando a tempos porque, repito, em questão de justiça, após o STF nada, só restando ao injustiçado agir por conta própria, a mercê da sua consciência e da sua coragem, duas declarações de ministros transformaram a minha decepção em apreensão: a primeira foi de Sua Excelência o Senhor Gilmar Mendes, e a segunda, de Sua excelência, Senhora Cármen Lúcia, ambos criminalizando parcela considerável da sociedade, o que passo a comentar a seguir.
Em recente palestra, o Sr. Gilmar Mendes, referindo-se à presidente Dilma, afirmou que ela teria falado “nós fazemos o diabo para ganhar a eleição”, seguindo, no seu comentário: “Agora sabemos o que eles podem fazer para ganhar a eleição, mas não na urna, em outro campo”.
A presidente Dilma realmente afirmou isso, quando candidata, numa disputa acirradíssima.
Descontextualizar é típico das pessoas pouco inteligentes, que não é o caso do magistrado em questão, ou que estejam agindo de má fé.
A seguir o Ministro emitiu um juízo de valor.
Ora, de um magistrado espera-se discrição e isenção, mais que necessárias, obrigatórias, se as críticas são direcionadas a alguém que possa vir a ser julgada pela corte suprema, da qual o Sr. Gilmar faz parte.
Juízes devem se ater aos autos dos processos e aos códigos judiciários, sob pena de estarem sendo levianos.
Quando Sua excelência expediu dois Habeas Corpus ao banqueiro Daniel Dantas, em menos de 48 horas, certamente agiu preso aos autos e à legislação, o mesmo acontecendo quando deu um Habeas Corpus a um médico estuprador que, sedando as suas pacientes, as estuprava (o médico fugiu e hoje vive nababescamente, no Líbano).
Descontextualizando, o que devo pensar dessas iniciativas? Não se justificando nos autos dos processos, o que levaria um Juiz a tal iniciativa?
Não o estou acusando de nada, apenas criando ilações nos mesmos moldes em que ele criou, em relação à presidente Dilma.
Depois a ministra Cármen Lúcia, referindo-se a mais um corrupto preso, este ligado à banda que permanece incólume no STF, preso por dois motivos: ser filiado à sigla que governa este país e, sem saber que estava sendo gravado, ter se referido a ligações de pelo menos quatro ministros desta corte com corruptos que, a pelo menos vinte anos, espoliam e infelicitam este país, assim se pronunciou: “A maioria de nós acreditou que a esperança tinha vencido o medo...”, repetindo o slogan de campanha do partido que está no governo.
Pelo cunho da afirmação, este pronunciamento é de um magistrado ou de um político em campanha?
Muitas vezes, mais que palavras, atitudes e iniciativas não condizem com a Magistratura, e menos ainda com o Ministério que exercem, e um bom exemplo disso é o Ministro Gilmar Mendes reunir-se com parlamentares, na casa do Deputado Eduardo Cunha, para traçarem diretrizes de impeachment da Presidente da República.
Primeiro que ligações tão estreitas entre poderes constitucionalmente independentes é espúria, ilegítima, ilegal.
Segundo que invalida a corte na sua essência, quando um Ministro vai à casa de um parlamentar que está sendo processado por corrupção, e que deverá ser julgado por esta mesma corte, para tratar da deposição de alguém que também, em tese, poderia vir a ser julgada por essa corte, criando um vício de origem, inabilitando a corte, por tendenciosa e parte ativa no processo.
Perdido em tantas contradições, busquei uma justificativa capaz de mostrar que estou errado, equivocado, sendo injusto e encontrei a afirmação da Excelentíssima Senhora Rosa Weber, também Ministra nesta corte, por ocasião da condenação do político José Dirceu: “Não tenho prova cabal contra Dirceu, mas vou condená-lo porque a literatura jurídica me permite”, Data Vênia, o equivalente a um médico cirurgião dizer “não tenho exames que atestem a doença no paciente, mas vou fazer a cirurgia porque o bisturi me permite”.
Se um dia conhecemos a ditadura do Executivo, no chamado Estado Novo, depois a dos Militares, além e acima dos três poderes, isto nos mostrou a inconveniência das ditaduras, em todas as suas formas e modalidades, inclusive do Judiciário.
Senhores, rogo a Deus e às Vossas consciências, para que a Suprema Corte da Justiça brasileira dispa-se da capa político partidária, do manto ideológico, e volte a vestir a toga da isenção, ferramenta primeira a nortear a justiça, porque sem ter a quem apelar, sem ter em que confiar, a nós só restarão as iniciativas pessoais, seguindo-se a barbárie, o caos, o fim, como sociedade organizada e civilizada.
Respeitosamente
Francisco Costa
Rio de Janeiro, 29/11/2015.
Concordo em número, grau e gênero.
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